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Authors
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Abstract(s)
O cancro é uma doença caracterizada pelo crescimento anormal e descontrolado de células que,
posteriormente, adquirem a capacidade de invadir outros tecidos. Para desenvolver novas terapias para
tratar o cancro é necessário entender as diferenças entre células normais e células tumorais. Uma dessas
diferenças está nas anomalias do centrossoma que têm sido encontradas em diversos tipos de tumores,
sugerindo uma possível função na formação e progressão tumorais. De facto, foi recentemente
demonstrado que a amplificação do número de centrossomas é suficiente para promover a tumorigénese
em ratinhos.
O centrossoma é o principal centro organizador de microtúbulos nas células animais, desempenhando
funções importantes na divisão celular, sinalização, polaridade e migração celulares. É um organelo
constituído por dois centríolos, centríolo mãe e centríolo filho, rodeados por uma matriz densa e
organizada de proteínas, material pericentriolar (PCM). O número de centríolos é altamente regulado
em células proliferativas, em estreita coordenação com o ciclo celular. No início do ciclo celular, na fase
G1, a célula apresenta apenas um centrossoma com dois centríolos. Na fase seguinte, fase S, inicia-se a
duplicação do centrossoma, processo que é regulado por diversas proteínas, incluído a PLK4, SAS6 e
STIL. Este processo consiste na formação de um novo centríolo na base de cada centríolo mãe préexistente. Durante a fase G2, estes dois novos centríolos crescem e atingem o seu comprimento final na
transição para a mitose. É na mitose que os dois centrossomas maturam e se separam, cada um com um
centríolo mãe e um centríolo filho, migrando para os polos opostos das células onde nucleiam os
microtúbulos que formam o fuso mitótico.
Falhas no processo de duplicação dos centrossomas, causadas pela desregulação de componentes
importantes no processo, podem causar anomalias centrossomais. Estas anomalias podem ser de caracter
estrutural, relacionadas com a expressão desregulada de genes que codificam componentes do
centrossoma e/ou modificações pós-traducionais que levam a mudanças no comprimento, tamanho ou
composição dos centríolos e/ou do PCM, ou numéricas, caracterizadas pela perda ou ganho do número
de centríolos. A amplificação do número de centrossomas é a anomalia mais frequentemente detetada
no cancro, mas o pouco conhecimento da sua origem e impacto na formação e progressão dos tumores
tem vindo a limitar o seu uso na área clínica. Para este tipo de estudos ser possível, é fundamental usar
um modelo de cancro humano que permita o estudo dos diferentes estádios da doença e assim desvendar
a presença e incidência destas anomalias em cada fase da doença, quais os mecanismos subjacentes a
essa amplificação e qual o seu papel na transformação maligna das células. Um excelente modelo de
cancro humano é a tumorigénese do esófago de Barrett. Este modelo permite o estudo dos vários estádios
da progressão tumoral devido não só ao fácil acesso a amostras desde a condição pré-maligna à
metástase, mas também ao acesso a um painel validado de linhas celulares representativas de cada um
desses estádios.
O esófago de Barrett (EB) é uma condição pré-maligna em que o normal epitélio escamoso estratificado
do esófago é substituído por um epitélio colunar metaplásico típico do epitélio do estomago/intestino,
sendo o refluxo gastroesofágico a sua principal causa. Esta alteração metaplásica é clinicamente
relevante pois representa um risco acrescido de evoluir para adenocarcinoma do esófago, apesar da baixa
probabilidade. A evolução para neoplasia é um processo com etapas conhecidas que vão desde a
metaplasia (EB), à displasia, adenocarcinoma e metástase. Nem todos os doentes com EB evoluem para
adenocarcinoma, porém, dado o elevado risco de progressão, estes doentes são incluídos em programas de vigilância onde são submetidos a biópsias endoscópicas periódicas que permitem a avaliação da
evolução da doença. Um estudo recente do nosso laboratório revelou que a amplificação dos
centrossomas, surge cedo na condição pré-maligna, num contexto de inflamação crónica, que aumenta
significativamente em displasia e que apenas foi detetada em doentes que progrediram para neoplasia,
sugerindo uma possível contribuição na progressão e transformação do EB. Assim, por um lado,
colocámos a hipótese de que a inflamação crónica, provocada pelo refluxo gastroesofágico, poderia
desempenhar um papel na origem da amplificação de centrossomas. Por outro lado, colocámos a
hipótese de que a amplificação dos centrossomas poderia promover a progressão tumoral através da
aquisição de propriedades malignas. Um dos mecanismos pelos quais a amplificação de centrossomas
pode levar à neoplasia é a potencial alteração do microambiente celular do EB através da libertação de
fatores inflamatórios. Sabe-se que algumas vias de sinalização envolvidas nas respostas inflamatórias e
imunes se encontram alteradas na progressão do EB. Assim, a amplificação dos centrossomas pode
promover a progressão tumoral ao contribuir para a desregulação das vias de sinalização e a resposta
inflamatória a esse microambiente.
Para testar estas hipóteses delineamos duas estratégias complementares: (i) usar células de metaplasia
sob a exposição intermitente prolongada ao refluxo crónico e avaliar mudanças no número e estrutura
do centrossoma ao longo do tempo correlacionando-as com vias de sinalização inflamatória, expressão
génica e secreção de moléculas sinalizadoras e (ii) induzir amplificação de centrossomas em células de
metaplasia e investigar o seu impacto na ativação de vias de sinalização inflamatórias (como a via do
NF-kB), produção de citocinas e se a presença de amplificação em metaplasia afeta a resposta celular
após um estímulo inflamatório.
Para testar a nossa primeira hipótese, investigámos se o refluxo crónico é suficiente para gerar
amplificação de centrossomas em células de metaplasia. Para isso, usámos o modelo dinâmico de cultura
in vitro da carcinogénese EB (BEC), no qual células de metaplasia sob exposição intermitente ao refluxo
crónico acumulam progressivamente alterações malignas que mimetizam a progressão clínica do EB.
Para entender melhor os mecanismos subjacentes, avaliámos como a alteração do número de
centrossomas se correlaciona com as alterações moleculares descritas neste modelo ao longo do tempo.
Os nossos resultados mostram não só que a amplificação de centrossomas pode contribuir para
alterações malignas na célula, como a instabilidade cromossómica, mas também que a exposição de
células de metaplasia ao refluxo crónico contribui para o aumento da amplificação de centrossomas e,
portanto, que a inflamação crónica pode realmente contribuir para o aumento da incidência dessas
alterações.
Para testar a nossa segunda hipótese, primeiro testámos dois métodos diferentes para aumentar os níveis
de amplificação do número de centrossomas em células de metaplasia: inibição da atividade do p53
usando um inibidor específico, e sobreexpressão de reguladores chave no ciclo de duplicação do
centrossoma - PLK4, SAS6 e STIL – através da transfeção de plasmídeos. Apesar de ambas as
estratégias usadas levarem ao aumento da incidência da amplificação, a estratégia de sobreexpressão de
moléculas-chave na biogénese dos centríolos foi mais eficiente, tendo um efeito mais impactante no
nível da amplificação nas células de metaplasia. É importante salientar que, ao aumentar os níveis de
amplificação através da manipulação de diferentes moléculas, a abordagem da transfeção permite-nos
confirmar se o fenótipo observado nas células de metaplasia é de facto uma consequência direta do
aumento do número de centrossomas, e não apenas devido à disfunção de moléculas especificas. Os
resultados obtidos com o inibidor mostraram aumento na incidência da amplificação dos centrossomas
após dois dias de tratamento com o inibidor. No entanto, a partir dos dois dias este aumento deixou de
ser observado. Assim, apesar de ser observado um aumento na amplificação dos centrossomas com a inibição da atividade do p53, proteína com múltiplas funções na célula e cuja depleção mostrou levar a
um aumento dos níveis de amplificação em células de metaplasia, estes resultados não foram muito
conclusivos, sendo necessária otimização adicional no futuro. Pelo contrário, os resultados obtidos com
a transfeção de PLK4, SAS6 e STIL mostraram que a sobreexpressão destas moléculas leva a um
aumento dos níveis de amplificação dos centrossomas ao longo do tempo. Adicionalmente, mostraram
que com o aumento dos níveis de amplificação há, também, um aumento na ativação da via de
sinalização inflamatória do NF-kB, uma importante via que controla a ativação de vários genes
envolvidos nas respostas inflamatórias e imunes e, que se sabe estar constitutivamente ativa em vários
tipos de tumores, incluindo na via de tumorigénese do EB.
Estes resultados apoiam, portanto, um papel da amplificação dos centrossomas na transformação
maligna, nomeadamente na desregulação de importantes vias de sinalização que podem alterar o
microambiente do EB através da libertação de fatores inflamatórios em metaplasia, e fornecem pistas
importantes sobre os mecanismos através dos quais a amplificação dos centrossomas contribuem para a
formação e progressão tumorais que serão explorados no futuro. Estes resultados poderão contribuir
para o desenvolvimento de novas ferramentas clínicas, particularmente o uso da amplificação dos
centrossomas como um biomarcador de progressão do EB. Dada a ampla ocorrência de amplificação
dos centrossomas em cancros humanos, estes resultados podem ser estendidos a outros cancros e/ou
doenças, como ciliopatia e microcefalia, onde a desregulação dos centrossomas é prevalente.
Centrosome amplification (CA) is a hallmark of cancer. It has been described in most human cancers and it is correlated to advanced tumor grade and poor clinic outcome. However, the poor knowledge of the causes and consequences of centrosome abnormalities in human cancer has limited the use of centrosome aberrations as biomarkers or as therapeutic targets in the clinical setting. Barrett’s esophagus (BE) is a pre-malignant condition, and its main risk factor is chronic inflammation. The neoplastic progression of BE occurs through a progressive sequence of histological and molecular changes that begin with metaplasia (premalignant condition) to low- and high-grade dysplasia (intraepithelial neoplasia), adenocarcinoma (invasive neoplasia) and metastasis. Since CA arises early in BE metaplasia, in the context of chronic inflammation, and that its incidence significantly increases from metaplasia to dysplasia, we hypothesized that the microenvironment of BE may play a role in generating CA in metaplasia and/or that CA may affect the inflammatory microenvironment, and thus, promote tumor initiation and BE progression. To test if BE microenvironment plays a role in generating CA in metaplasia, we investigated whether chronic reflux is sufficient to generate CA in metaplastic cells. To address this question, we assessed centrosome numbers in the dynamic in vitro model of BE carcinogenesis (BEC), in which metaplastic cells under prolonged intermittent exposure to chronic reflux progressively accumulate malignant transformations that closely mimic clinical progression of BE. Here we shown that not only chronic reflux contributes to increased CA incidence and that such increased CA precedes, and therefore likely contributes to, chromosomal instability (CIN) in BE progression. To test the impact of CA in inflammatory signaling pathways and modulation of BE microenvironment, we first tested two different methods to increase the levels of CA in metaplastic cells: (i) inhibition of p53 activity and (ii) overexpression of key regulators in centrosome biogenesis - PLK4, SAS6 and STIL. While both strategies led to increased CA levels, the results obtained by overexpressing key centriole biogenesis molecules were more expressive and consistent. Importantly, by providing the opportunity to increase CA levels by manipulating different molecules, the transfection approach allowed us to confirm if the phenotype seen in metaplastic cells is in fact a consequence of the increase in the incidence of CA, and not only due to dysfunction of specific molecules. Our results showed that overexpression of key regulators of centriole biogenesis leads to increased CA levels over time and that this increase led to activation of NF-kB, an important inflammatory signaling pathway, that is constitutively active in a wide variety of human tumors, including BE tumorigenesis. These findings support a role for CA in malignant transformation, including the deregulation of important signaling pathways that may impact BE microenvironment through the release of inflammatory factors, and provide important clues about mechanisms by which CA contributes to tumor formation and progression that will be explored in the future. A better understanding of the impact of CA in BE progression may contribute to the development of new clinical tools, particularly the use of CA as a biomarker of progression. Given the widespread occurrence of CA in human cancers, this knowledge may be extended to other cancers and/or diseases, such ciliopathies and microcephaly, where centrosome deregulation occurs.
Centrosome amplification (CA) is a hallmark of cancer. It has been described in most human cancers and it is correlated to advanced tumor grade and poor clinic outcome. However, the poor knowledge of the causes and consequences of centrosome abnormalities in human cancer has limited the use of centrosome aberrations as biomarkers or as therapeutic targets in the clinical setting. Barrett’s esophagus (BE) is a pre-malignant condition, and its main risk factor is chronic inflammation. The neoplastic progression of BE occurs through a progressive sequence of histological and molecular changes that begin with metaplasia (premalignant condition) to low- and high-grade dysplasia (intraepithelial neoplasia), adenocarcinoma (invasive neoplasia) and metastasis. Since CA arises early in BE metaplasia, in the context of chronic inflammation, and that its incidence significantly increases from metaplasia to dysplasia, we hypothesized that the microenvironment of BE may play a role in generating CA in metaplasia and/or that CA may affect the inflammatory microenvironment, and thus, promote tumor initiation and BE progression. To test if BE microenvironment plays a role in generating CA in metaplasia, we investigated whether chronic reflux is sufficient to generate CA in metaplastic cells. To address this question, we assessed centrosome numbers in the dynamic in vitro model of BE carcinogenesis (BEC), in which metaplastic cells under prolonged intermittent exposure to chronic reflux progressively accumulate malignant transformations that closely mimic clinical progression of BE. Here we shown that not only chronic reflux contributes to increased CA incidence and that such increased CA precedes, and therefore likely contributes to, chromosomal instability (CIN) in BE progression. To test the impact of CA in inflammatory signaling pathways and modulation of BE microenvironment, we first tested two different methods to increase the levels of CA in metaplastic cells: (i) inhibition of p53 activity and (ii) overexpression of key regulators in centrosome biogenesis - PLK4, SAS6 and STIL. While both strategies led to increased CA levels, the results obtained by overexpressing key centriole biogenesis molecules were more expressive and consistent. Importantly, by providing the opportunity to increase CA levels by manipulating different molecules, the transfection approach allowed us to confirm if the phenotype seen in metaplastic cells is in fact a consequence of the increase in the incidence of CA, and not only due to dysfunction of specific molecules. Our results showed that overexpression of key regulators of centriole biogenesis leads to increased CA levels over time and that this increase led to activation of NF-kB, an important inflammatory signaling pathway, that is constitutively active in a wide variety of human tumors, including BE tumorigenesis. These findings support a role for CA in malignant transformation, including the deregulation of important signaling pathways that may impact BE microenvironment through the release of inflammatory factors, and provide important clues about mechanisms by which CA contributes to tumor formation and progression that will be explored in the future. A better understanding of the impact of CA in BE progression may contribute to the development of new clinical tools, particularly the use of CA as a biomarker of progression. Given the widespread occurrence of CA in human cancers, this knowledge may be extended to other cancers and/or diseases, such ciliopathies and microcephaly, where centrosome deregulation occurs.
Description
Tese de Mestrado, Biologia Molecular e Genética , 2022, Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências
Keywords
Cancro humano Esófago de Barrett Amplificação do centrossoma Inflamação Progressão do tumor Teses de mestrado - 2023