Name: | Description: | Size: | Format: | |
---|---|---|---|---|
5.14 MB | Adobe PDF |
Authors
Advisor(s)
Abstract(s)
No mar profundo, abaixo dos 200 metros, a ausência de luz solar impede a produção fotossintética
e a maioria dos organismos depende dos nutrientes provenientes das águas superficiais. Em 1977, a
descoberta de uma fonte hidrotermal forneceu a primeira evidência para um “novo” modo de nutrição,
conhecido como quimiossíntese – processo pelo qual as bactérias produzem matéria orgânica através da
oxidação dos compostos presentes nos fluídos hidrótermais. Outro ecossistema quimisossintético foi
descoberto posteriormente, as designadas fontes frias – locais caracterizados pela libertação de enxofre
e metano ao longo de fisuras no fundo do mar. A descoberta de fontes frias e de carcaças de baleias ou
navios de madeira afundados, normalmente designados de restos orgânicos, revelou semelhanças com
as fontes hidrotermais, relativamente ao modo de nutrição e adptações fisiológicas das comunidades. A
comunidade cientifífica tem estudado a fauna, estruturas tróficas, características geoquímicas e padrões
de distribuição destes ecossistemas quimiosintéticos desde a sua descoberta. Contudo têm-se registado,
nas últimas decadas, um crescente interesse da indústria em explorar os recursos naturais das fontes
hidrotermais e fontes frias, considerando-se a maior ameaça à sua biodiversidade. Contrariamente, às
fontes hidrotermais, as fontes frias têm recebido menos atenção, porém para além da exploração mineira,
a sua vulnerabilidade tem aumentado em resultado de uma maior exposição a atividades antropogénicas,
associadas à sua localização nas margens continentais, nomeadamente devido à pesca de arrasto,
poluição e alterações climáticas.
Diversos estudos revelam que a amostragem de fontes frias é desigual e inconsistente ao longo do
fundo do mar, porém os padrões e as lacunas de conhecimento não estão conhecidos ou quantificados.
Identificar estes parâmetros com recurso a dados atuais é fundamental para desenvolver medidas de
proteção eficientes, que visem impedir a exploração de gás das fontes frias, e preservar a sua
biodiversidade. Assim, esta dissertação tem como objetivo investigar a distribuição geográfica das
fontes frias, e identificar e quantificar padrões e lacunas no conhecimento das fontes frias, a nível
taxonómico e ecológico. Os dados relativos à distibuição das espécies de metazoários (mega-, macro- e
meiofauna) em fontes frias foram compilados com recurso a bases de dados online, literatura científica
e suporte de membros da comunidade científica.
Usando dados provenientes de diferentes fontes, recolheu-se um total de 307 fontes frias, o que
revelou um aumento de 43% no número de fontes frias descritas relativamente à última compilação de
dados em 2006. As fontes frias estão associadas a maioritariamente às margens continentais,
principalmente ao talude continental, com profundidades que variam entre os 200 e os 2 000 metros.
Nestes locais as forças gravitacionais e tectónicas criam fraturas por onde o metano e compostos
reduzidos, como o enxofre emergem. Ocasionalmente, as fontes frias podem também ocorrer na zona
abissal (2 000 – 6 000 metros) e nas fossas oceânicas, onde se registaram três locais a mais de 6 000
metros de profundidade. As fontes frias foram associadas a 33 áreas geográficas distribuídas ao longo
de todo o globo, porém existem diferenças acentuadas na sua distribuição; a maioria das fontes frias
(226) pertencem a áreas geográficas localizadas no Hemisfério Norte. De um total de 33 áreas
geográficas designadas, 23 áreas situam-se no hemisfério norte e apenas 10 foram registadas no
hemisfério sul. As margens continentais das regiões polares e do hemisfério sul, como o caso da costa
ocidental de África permanecem, na sua maioria por amostrar.
A presença de metazoários verificou-se em 251 das 307 fontes frias identificadas, tendo-se recolhido
dados de metazoários de diferentes níveis taxonómicos, desde a espécie até ao filo. A diferença entre os
dois hemisférios é reafirmada pelo número de registos taxonómicos. As áreas geográficas melhor
documentadas a nível taxonómico são a Costa Rica (2872), o Golfo do México (1447) e o Japão (746)
todas elas pertencentes ao hemisfério norte. O acesso a taxonomistas suporta a classificação da maioria
dos registos ao nível das espécies, o que explica o elevado grau de conhecimento biológico nestas áreas
geográficas. As áreas do hemisfério sul, por outro lado, estão restritas a alguns registos taxonómicos. A falta de conhecimento das áreas geográficas presentes no hemisfério sul está diretamente relacionada
com o progresso dos seus países. Países em vias de desenvolvimento que carecem de apoio financeiro e
técnico não reúnem as condições necessárias para explorar as suas margens continentais.
A análise taxonómica revelou que dois filos, Molusca e Anelida, surgem amplamente distríbuidos
pelas diferentes áreas geográficas. Concretamente, três classes taxonómicas (Bivalvia, Gastropoda e
Poliqueta) são responsáveis por esta dominância, uma vez que os seus organismos desenvolveram
estratégias que lhes permitem viver nestes ecossistemas, como por exemplo a aquisição de bactérias
simbióticas que sustentam o modo de nutrição do hospedeiro. A classificação dos registos taxonómicos
segundo uma classe de tamanho sugere que a macrofauna é a classe melhor documentada ao longo de
todas as áreas geográficas, porque é fácil de observar, recolher e identificar pelos taxonomistas. Por
outro lado, a meiofauna, normalmente dominada pelo filo Nematoda, surge ocasionalmente e apresenta
poucos registos identificados até ao nível da espécie. O pequeno tamanho corporal, o estilo de vida
bentónico, a falta de taxonomistas e o uso de imagens e vídeos para descrever as comunidades das fontes
frias faz com que a meiofauna seja frequentemente neglegenciada.
Tendo em conta a comunidade biológica identificada em cada área geográfica, observou-se que ao
nível da espécie esta variava substancialmente de área para área. A maioria das áreas geográficas exibiu
uma composição totalmente diferente, em resultado de uma total ausência de espécies partilhadas. A
ausência de espécies partilhadas pode estar relacionada com a alta heterogeneidade dos habitats
observados em fontes frias, que geram diferentes pressões nas espécies e proporcionam diferentes
oportunidades para a especiação. De um total de 1184 espécies reportadas, apenas cinco espécies foram
encontradas simultaneamente em fontes frias, fontes hidrotermais e restos orgânicos. Um total de 494
espécies foram registadas apenas uma vez em fontes frias e restritas a este ecossistema
quimisossintético. A maioria destas espécies pertence a filos bem estudados, como o filo Molusca e
Artrópode, e à classe de tamanho macrofauna, sendo por isso facilmente observadas, amostradas e
identificadas. Assim, estes resultados sugerem que algumas das espécies únicas podem ser, de facto,
espécies endémicas de certas áreas geográficas tendo evoluído por diferentes processos de especiação.
Apesar de diversos autores mencionarem que as fontes frias têm um alto grau de endemicidade, ao nível
da espécie, nenhum outro estudo reportou um número tão elevado de espécies únicas. Os resultados
obtidos são suportados por um grande volume de dados recolhidos no âmbito desta dissertação e
provenientes de diferentes fontes bibliográficas e áreas geográficas.
Estudos futuros são fundamentais para identificar se alguma das áreas geográficas apresenta alta
endemicidade, uma vez que as espécies endémicas estão mais expostas aos impactos antropogénicos,
nomeadamente ao aumento do interesse da indústria em matérias-primas. As fontes frias não sendo
frequentemente consideradas áreas prioritárias em medidas de conservação são um importante
ecossistema para o planeta Terra, pelo que é urgente que este ecossistema beneficie de medidas de
conservação relevantes capaz de proteger a sua biodiversidade única. Os padrões e lacunas de
conhecimento identificados neste estudo irão fornecer orientação para futuras pesquisas científicas e
medidas de conservação para fontes frias. Para além disto, esta dissertação pode ainda ser utilizada para
orientar estudos semelhantes noutros ecossitemas quiomiossintéticos atualmente sob ameaça, como as
fontes hidrotermais. A Década das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável dos Oceanos é
uma excelente oportunidade para melhorar o nosso conhecimento em fontes frias e outros ecossistemas
quimissintéticos e ajudar a protêge-los.
After the discovery of chemosynthesis-based ecosystems (CBEs), namely hydrothermal vents, cold seeps and organic remains, scientists focused on the study of their faunal communities, trophic structure, geochemical features, and distribution patterns. The pressure to explore CBEs’ natural resources without guidelines or regulation plans has increased in the last decades and is currently a major threat to their unique biodiversity. Seeps' vulnerability has increased substantially as a result of increased exposure to anthropogenic activities, including bottom trawling, oil and gas exploitation, waste disposal, pollution, and climate change. Previous studies have identified that seeps are unevenly sampled across the deep-sea, but patterns and knowledge gaps across existing data is not available. Addressing these questions using novel species data is of paramount importance to support future studies and to develop measures to protect seeps from hydrocarbon extraction. Therefore, this study aims to investigate the spatial distribution of seeps worldwide, and to underpin and quantify taxonomical, and ecological patterns and knowledge gaps across cold seeps. More specifically, metazoan species distribution will be analysed from an up to date dataset compiled primarily from online databases, the literature and through personal communications. A total of 307 seeps were collected, representing an increase of 43% in the number of cold seeps reported since the last data compilation in 2006. The highest number of cold-seep sites were associated to the continental slope of the Northern Hemisphere distributed across 23 geographic areas, while only 10 areas were recorded in the Southern Hemisphere. The continental margins of polar regions, and the western coast of Africa remain mostly unsampled. Metazoan related data was available from 251 cold seep sites. Taxonomical analysis revealed that the two most-studied phyla identified at the majority of seeps, Mollusca, and Annelida, were also part of the macrofauna size class. Meiofauna was the least studied size class; Nematoda phylum, often the most abundant taxa of the meiofauna class, was poorly sampled across the geographic areas and lack records at the species level. Of 1184 species reported, 478 species were unique to seeps and restricted to a single occurrence. The unique records comprise mostly taxa from well-studied phyla and the macrofauna class, hence easy to visualise and sample. Thus, our records suggest some level of endemicity in cold seeps. The identified distribution patterns and knowledge gaps will provide guidance and support for future scientific research priorities and conservation measures.
After the discovery of chemosynthesis-based ecosystems (CBEs), namely hydrothermal vents, cold seeps and organic remains, scientists focused on the study of their faunal communities, trophic structure, geochemical features, and distribution patterns. The pressure to explore CBEs’ natural resources without guidelines or regulation plans has increased in the last decades and is currently a major threat to their unique biodiversity. Seeps' vulnerability has increased substantially as a result of increased exposure to anthropogenic activities, including bottom trawling, oil and gas exploitation, waste disposal, pollution, and climate change. Previous studies have identified that seeps are unevenly sampled across the deep-sea, but patterns and knowledge gaps across existing data is not available. Addressing these questions using novel species data is of paramount importance to support future studies and to develop measures to protect seeps from hydrocarbon extraction. Therefore, this study aims to investigate the spatial distribution of seeps worldwide, and to underpin and quantify taxonomical, and ecological patterns and knowledge gaps across cold seeps. More specifically, metazoan species distribution will be analysed from an up to date dataset compiled primarily from online databases, the literature and through personal communications. A total of 307 seeps were collected, representing an increase of 43% in the number of cold seeps reported since the last data compilation in 2006. The highest number of cold-seep sites were associated to the continental slope of the Northern Hemisphere distributed across 23 geographic areas, while only 10 areas were recorded in the Southern Hemisphere. The continental margins of polar regions, and the western coast of Africa remain mostly unsampled. Metazoan related data was available from 251 cold seep sites. Taxonomical analysis revealed that the two most-studied phyla identified at the majority of seeps, Mollusca, and Annelida, were also part of the macrofauna size class. Meiofauna was the least studied size class; Nematoda phylum, often the most abundant taxa of the meiofauna class, was poorly sampled across the geographic areas and lack records at the species level. Of 1184 species reported, 478 species were unique to seeps and restricted to a single occurrence. The unique records comprise mostly taxa from well-studied phyla and the macrofauna class, hence easy to visualise and sample. Thus, our records suggest some level of endemicity in cold seeps. The identified distribution patterns and knowledge gaps will provide guidance and support for future scientific research priorities and conservation measures.
Description
Tese de Mestrado, Ciências do Mar, 2022, Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências
Keywords
Ecossistemas quimisossintéticos Amostragem irregular Macrofauna Meiofauna Espécies únicas Teses de mestrado - 2022