Cadete, TeresaGöerne, Nora2017-01-192017-01-192016-12-142016-09-16http://hdl.handle.net/10451/26021A cobertura da crise da zona euro e o papel da Alemanha atraiu um vasto interesse no meio académico, embora os discursos dos média portugueses tivessem sido em larga medida ignorados na maioria dos estudos publicados. Actualmente, é reconhecida a influência dos discursos dos média na opinião publica e nas políticas públicas. Neste sentido, esta tese pretende analisar representações da Alemanha em dois tipos de média portugueses durante o crise da zona Euro: os jornais (nomeadamente Público e Jornal das Notícias) e manifestações de arte urbana portuguesa, juntamente com os sinais que foram emitidos durante protestos públicos, o que chamarei “média menores”. Na sequência da crise financeira no início do século XXI, mais detalhes foram revelados sobre um excesso de dívida pública na Grécia no final de 2009 e no decurso do ano seguinte, surgiram preocupações acerca da situação financeira e as dívidas de outros países como Portugal, a Espanha e a Itália (GIPS): Daí as alegadas tentativas para ajudar e salvar os GIPS com vários pacotes de ajuda financeira. A maneira em que a crise da zona euro foi sendo coberta pelos média nacionais tornou-se num assunto para muitas investigações académicas. Grandes estudos quantitativos a nível europeu, bem como pequenos projectos de investigação qualitativa focados no discurso dos média de um país específico, têm sido realizados. Surpreendentemente, Portugal nunca foi tido em consideração nestes estudos. Muitos projectos de investigação que têm explorado discursos dos média em apenas um ou dois países diferentes da UE concentraram-se na Grécia ou na Alemanha ou ambos. Em geral, podemos dizer que Portugal e os média portugueses foram amplamente ignorados na maioria dos projectos de pesquisa académica, salvo algumas excepções. Como vários estudos sobre a cobertura dos média da crise da zona euro já fizeram notar, a Alemanha é frequentemente vista como sendo parcialmente responsável pela crise da zona euro (Young e Semmler, 2011) e pelo que são chamados“programas de austeridade” (Ntampoudi, 2014). Por esta razão é importante considerar não só a cobertura da média da crise da zona euro em geral mas também particularmente o discurso da média sobre Alemanha e o seu papel na crise. O tópico de representações estereotipadas da Alemanha nos média externos já foi examinado em vários outros estudos. Atitudes críticas face à Alemanha aumentaram, vi juntamente com o aumento de influência da Alemanha no século XX. Em consequência, observações hostis e até mesmo teorias da conspiração começaram a ganhar popularidade, atingindo um primeiro pico na Primeira Guerra Mundial e outro, intensificado, na Segunda Guerra Mundial. De acordo com os estudos sobre discursos dos média contemporâneos sobre a Alemanha e o seu papel na crise da zona euro, uma imagem semelhante emerge com a representação da Alemanha como a principal ou mesmo única responsável pelas fricções políticas. Frequentemente, a Chanceler Angela Merkel é colocada no centro desta crítica, com imagens em que Merkel é retratada como Hitler, como foi o caso em certos média gregos. Este processo de culpabilização também se encontra do lado da Alemanha: os países de GIPS, particularmente a Grécia, foram retratados pelos média alemães como "desorganizados", "preguiçosos", "indisciplinados" e "insidiosos" entre outros. Assim é pintado o contraste entre uma Alemanha alegadamente “trabalhadora” e uma Grécia pretensamente “indisciplinada”, invocando uma narrativa segundo a qual os Alemães teriam de pagar as dívidas da Grécia e do resto do sul da Europa. Embora que não haja estudos sobre o discurso dos média portugueses sobre a Alemanha, existem alguns artigos e estudos que tratam o discurso público sobre a Alemanha em Portugal e também sobre protestos e mobilizações anti-austeridade em Portugal. É por esta razão que é importante "olhar para o discurso público' para além dos suspeitos habituais [...] O discurso político e o discurso de média que dominam hoje o chamado ‘discurso público’ é auto-reforçando" (Murray-Leach et al, 2014, pág. 54). A fim de também não cair nessa armadilha, não pretendo olhar só para o discurso dos média portugueses tradicionais, mas considerar também outras formas de discurso público tais como a arte urbana e graffiti. Usando as pesquisas de opinião pública de Gallup World Poll, podemos constatar que apenas 30% em 2011, 29% em 2013 e 41% em 2014 dos portugueses questionados aprovaram a liderança alemã e em 2011 mais da metade dos entrevistados (55%) disseram que não sabem ou que recusaram responder a esta pergunta. O apoio à Alemanha entre 2011 e 2013 permaneceu estável, mas muitas pessoas mudaram de opinião de "não sei" / "recusar a responder" para uma desaprovação. A questão reside agora em saber se essa desaprovação se reflecte nos média portugueses, bem como na arte urbana e nos graffiti. vii Para conseguir obter uma visão em ambas as narrativas – hegemónicas e alternativas - a análise inclui artigos de dois jornais portugueses, Público e Jornal de Notícias - dois jornais diários de grande circulação. Estes dois jornais pertencem a diferentes tipos de jornalismo, o que torna a comparação ainda mais interessante. Também foi incluido o estudo de média considerados menores: arte urbana, graffiti e sinais de protestos públicos, manifestações e ocupações. Graffiti, arte urbana e imagens dos protestos serão agrupados sob o termo de “média menores”, média produzidos por actores subterrâneos que têm uma tendência para apresentar narrativas alternativas. Protestos públicos podem ser considerado como outra maneira de manifestar opiniões divergentes. Dependendo da perspectiva, estes protestos públicos podem ser também considerados como parte do discurso público. A comparação entre ambos os tipos de média (os dois jornais populares e os média menores) exigiu uma abordagem mista de método, combinando elementos quantitativos bem como métodos qualitativos. A investigação para representações da Alemanha e da chanceler Angela Merkel nestes jornais foi feito para os artigos que foram publicados dentro do período de 11 de Março de 2011 (dia da manifestação da chamada “Geração à Rasca”) e 19 de Maio de 2014 (dois dias depois da saída de Portugal do programa de ajustamento económico da União Europeia). Quanto à arte da rua e à fotografia das faixas de protestos públicos, a escolha de um período de tempo bem definido foi mais complicada por causa da natureza efémera de arte urbana, na medida em que datas exactas de existência de alguma espécie dessa mesma arte são especificamente difícil de definir. A tese incorpora o “cultural effects theory”, que defende que a influência dos média sobre a opinião pública é dependente da situação social e a experiência pessoal de um indivíduo e que "o processo de construção de crenças e valores ao longo do tempo é auxiliada pela utilização generalizada de estereótipos", que são utilizados pelos jornalistas como atalhos (Grix & Lacroix, 2006, p. 376). Através de análise de narrativa - articulada com a abordagem inovadora da ciência social desta tese - duas narrativas prevalentes foram identificadas como tendo sido usadas consistentemente nos média principais e nos média menores, baseadas em representações estereotipadas. A primeira narrativa é marcada por um discurso reducionista, no qual Merkel surge representada como uma Doppelgängerin de Hitler. A narrativa implica que Merkel quereria viii estabelecer um "Quarto Reino" através da imposição de medidas económicas draconianas noutros países. Ambos os tipos de média aqui considerados representaram Merkel como uma antagonista ou usaram-na como uma sinédoque da Alemanha. Isto resultou muitas vezes em referências a Hitler e a Alemanha da Segunda Guerra Mundial, directas ou indirectas. Estas comparações não são apenas uma redução assustadora das atrocidades de Hitler, como também representam uma falácia (reductio ad Hitlerum) do ponto de vista retórico. A segunda narrativa tem a ver com a percepção da desigualdade existente entre Portugal e Alemanha. Pela utilização de diferentes metáforas tais como o marionetista, o professor e o médico, a Alemanha é retratada como um poder superior que Portugal tem de respeitar e a que tem de obedecer. Este tipo de narrativa é exemplificado pela fábula de Esopo, a da formiga trabalhadora e da cigarra preguiçosa. No contexto de Portugal e da Alemanha, tal comparação resulta numa oposição da mentalidade do Norte (produtivo) à do Sul (ocioso). As metáforas do marionetista, do médico e do professor também se relacionam com a narrativa do Quarto Reino: Portugal é considerado como sofrendo de uma falta de soberania. Usando a abordagem de Jack Lule dos sete mitos dominantes, é argumentado que muita da cobertura de notícias de Portugal e dos média menores é moldada pelo mito do bode expiatório. O enquadramento da Alemanha como um bode expiatório não é exclusivo dos média portugueses mas este mito também foi encontrado nos média de outros países dos GIPS. Por outro lado, é salientado que os média alemães retratam os países dos GIPS como preguiçosos e participam no processo de criação de bodes expiatórios mútuos. Porém, é sabido que todas as narrativas simplistas e a intenção de tornar figuras políticas ou países em bodes expiatórios só vai aumentar a percepção da clivagem entre o Norte e o Sul da União Europeia. Tal processo, em combinação com o aumento dos movimentos nacionalistas, poderia levar a uma desintegração europeia.The media coverage of the Eurozone crisis and Germany’s role in it has received much academic interest, however the Portuguese media discourses have been largely disregarded in most studies. As this thesis suggests, it is important to be aware of media discourses because they play an important role in shaping public opinion and public policy making. In this sense, this thesis explores common narratives and representations that are used to make sense of Germany’s role in the Eurozone crisis (2011-2014) in various types of Portuguese media. In order to gain an insight in both hegemonic and alternative narratives, the analysis included articles from two major newspapers, Público and Jornal de Notícias, as well as minor media: street art, graffiti and public protests. It was assumed that that these two types of media would use different discourses on Germany but in fact, there were many similarities. Through narrative analysis, two prevalent narratives have been identified that were used both in the press and in minor media. The first narrative was marked by a reductionist discourse. Merkel was represented as Hitler’s doppelgänger aiming to establish a “Fourth Reich” through imposing draconic economic measures on other European countries. The second narrative revolves around the perceived unequal relationship between Portugal and Germany. By the use of different metaphors such as the puppeteer, the teacher and the doctor, Germany is portrayed as a superior power that Portugal bows to either voluntarily or involuntarily. Using Jack Lule’s approach of the seven master myths, it is argued that much of the Portuguese news coverage and the minor media are shaped by the ancient myth of the scapegoat. Casting Germany as a scapegoat is not unique to the Portuguese media but this myth has also been found for instance in Greek media. Contrariwise, it is pointed out that German media portrays the countries commonly known as PIGS (Portugal, Italy, Greece, Spain) as lazy and participates in the process of mutual scapegoating, which could provoke dangerous consequences and lead to further European disintegration.engCrise económica (2008) - Zona euroAlemanha - Nos meios de comunicação social - PortugalMeios de comunicação social e políticaAlemanha - Na arte - PortugalArte e política - PortugalTeses de mestrado - 2016Narrating the eurozone crisis : representations of Germany in Portuguese media and on the streetsmaster thesis201407833