Utilize este identificador para referenciar este registo:
http://hdl.handle.net/10400.5/97563
Título: | The adaptive evolution of early phase clinical trial designs in oncology : a narrative review |
Autor: | Ricardo, Beatriz Maria Vargas |
Orientador: | Costa, Luís Mansinho, André |
Palavras-chave: | Oncologia Medicina de precisão Ensaios basket Master protocols Seamless designs Teses de mestrado - 2024 |
Data de Defesa: | 6-Nov-2024 |
Resumo: | A investigação clínica é o método através do qual se estuda e desenvolve novos medicamentos, com o objetivo de melhorar a saúde humana em todas as áreas terapêuticas, e procede-se normalmente através das seguintes fases distintas com diferentes focos, e aumento gradual de participantes:
Fase I: centrada na avaliação da segurança e de parâmetros farmacocinéticos e farmacodinâmicos (pharmacokynetic/ pharmacodynamic - PK/PD) de resposta à terapêutica;
Fase II: uma primeira avaliação de eficácia e dosagem;
Fase III: avaliação decisiva de eficácia;
Fase IV: estudos de vigilância pós-comercialização que pretendem obter informações adicionais sobre a segurança e a eficácia de um medicamento em situações reais (após aprovação para comercialização).
O desenvolvimento de medicamentos seguindo este processo é moroso, levando atualmente entre 7 a 10 anos, contempla uma grande sobrecarga burocrática a cada submissão de uma nova fase, e resulta em elevadas taxas de atrito – por exemplo, apenas cerca 5% dos medicamentos que foram submetidos a fase I conseguiram introdução no mercado entre 1991 e 2000. Em Oncologia, a Investigação Clínica teve uma evolução particularmente interessante ao ter passado por uma tremenda mudança de paradigma após o aparecimento da medicina de precisão, o que envolveu a alteração de pontos considerados essenciais na investigação clínica tradicional. Nesta dissertação, é realizada uma extensa revisão narrativa com o objetivo de acompanhar o percurso da investigação em Oncologia, desde o aparecimento dos ensaios aleatorizados, até aos dias de hoje.
Anteriormente, as terapias dependiam normalmente da classificação da patologia no órgão de origem, baseando-se muitas vezes numa abordagem citotóxica em que a divisão celular e a replicação do ADN são bloqueadas, originando efeitos secundários que se sentem de forma geral em todo o organismo e não apenas nas células tumorais (baixos níveis de eritrócitos e leucócitos no sangue, queda de cabelo, etc.). O aparecimento da medicina de precisão possibilitou uma mudança de foco nos tratamentos em Oncologia, onde, com o avanço na sequenciação genética, se torna agora possível identificar mutações específicas de cada tumor, permitindo a investigação de novas terapêuticas independentemente da histologia e, possibilitando a criação de tratamentos mais individualizados, direcionados, com mais eficácia, e menos efeitos secundários.
Inicialmente, os primeiros tratamentos oncológicos recorriam à remoção de tumores com intervenções cirúrgicas. A descoberta dos raios-X no final do séc. XIX abriu caminho a novas possibilidades com tratamentos de radioterapia, e a própria investigação clínica misturou-se com a evolução das terapêuticas aquando da emergência dos ensaios clínicos randomizados e dos primeiros tratamentos com quimioterapia nos anos 40. Atualmente, métodos combinados destas três intervenções continuam a ser os mais utilizados na luta contra o cancro, mas a medicina de precisão tem crescido e conseguido o seu lugar como novo interveniente. A medicina de precisão baseia-se fundamentalmente em três pilares: terapias direcionadas (targeted therapies), imunoterapias, e biomarcadores.
As terapias direcionadas consistem em moléculas (muitas vezes anticorpos monoclonais) que atacam características específicas das células cancerígenas e bloqueiam atividades essenciais para o crescimento tumoral (por exemplo, estimulam apoptose ou bloqueiam a angiogénese), acabando por minimizar os danos nas células saudáveis.
A imunoterapia, por sua vez, destina-se a estimular a resposta imunitária do próprio organismo contra as células cancerígenas. Em situações normais, as células do sistema imunitário reconhecem e eliminam células anormais, mas as células cancerígenas possuem mecanismos que as tornam capazes de evadir o sistema imunitário. As classes mais estudadas desta terapêutica envolvem as células T, leucócitos cruciais na identificação e eliminação de células desconhecidas no organismo. As terapias com células CAR-T (chimeric antigen receptor T cells) e com recetores de células T modificados, por exemplo, são terapias onde as próprias células T dos doentes são modificadas ex vivo para expressarem um recetor que reconhece um antigénio específico do tumor, tornando-se capazes de atacar a célula cancerígena. Os inibidores de checkpoint nas células T, por outro lado, atuam na interação entre as células T e as células cancerígenas, dando origem a uma resposta por parte do sistema imunitário, que antes não seria possível.
Os biomarcadores surgem como um grande apoio no diagnóstico, na deteção de respostas (adversas ou terapêuticas), na elaboração de critérios de elegibilidade em ensaios, na estratificação de participantes, e em prognósticos de segurança e eficácia.
Tudo isto significa também que o anterior desenho de ensaios clínicos, com um “tamanho único”, já não se aplica tão bem à medicina de precisão. Afinal, não é possível analisar estas subpopulações genéticas através dos desenhos tradicionais, as toxicidades observadas nestas abordagens são mais tardias, e a as relações de dose-resposta que já são bem conhecidas para as terapêuticas tradicionais não se aplicam tão bem a estes novos agentes. Além disso, é um objetivo da medicina de precisão diminuir as taxas de atrito, bem como o tempo e os custos do desenvolvimento de novas terapêuticas. Assim sendo, foi instituída a desafiante tarefa de inovar o design dos ensaios fase precoce em Oncologia, de forma a que a investigação se consiga adaptar a estas novas classes de medicamentos.
Primeiro, houve uma alteração nos endpoints dos ensaios. A abordagem tradicional consistia em escalar doses dentro da janela da toxicidade limitadora de dose, atingindo eventualmente uma dose máxima tolerada (maximum tolerated dose - MTD) e uma dose recomendada para a fase II. No entanto, com os fármacos da medicina de precisão, uma maior dose não significa necessariamente uma maior eficácia. Em vez de (ou para além de) estabelecer uma MTD, o objetivo passa a ser encontrar a dose biológica ótima, e envolve incluir novos endpoints como por exemplo parâmetros de PK/PD (como área sob a curva), endpoints dependentes de biomarcadores, alterações no tecido tumoral, entre outros, que possam melhor avaliar o mecanismo de ação e a resposta biológica destes novos agentes. Métodos como o Pharmacological Audit Trail (PhAT) foram desenvolvidos para acompanhar este desenvolvimento, avaliando quais os melhores endpoints, seguindo o comportamento farmacológico, e otimizando estratégias de dosagem. Os próprios métodos de escalada de dose sofreram alterações, sendo os tradicionais métodos baseados em regras pré-definidas (como o mais utilizado 3+3 e respetivas variações), substituídos por métodos baseados em modelos, fortemente sustentados por modelos farmacocinéticos e farmacodinâmicos, métodos estatísticos Bayesianos, e uma abordagem adaptativa para otimizar o equilíbrio entre eficácia e segurança. O Método de Reavaliação Contínua (Continual Reassesment Method) foi o pioneiro nesta nova abordagem, seguindo-se vários outros, e sendo neste momento o Bayesian Optimal Interval (BOIN) o mais utilizado.
Por último, os master protocols - ensaios basket, umbrella e plataforma - e os ensaios seamless, desenhos adaptativos, são os protagonistas da mudança de paradigma nos ensaios de fase precoce em Oncologia. Os ensaios basket consistem em desenhos em que uma mesma terapêutica é estudada em tumores de vários órgãos diferentes, que contém a mesma mutação. Os umbrella, contrariamente, centram-se num local/órgão e estudam diferentes intervenções que visam diferentes mutações nesse local. Os ensaios plataforma comparam os efeitos de várias intervenções com um grupo de controlo, com a principal caraterística das intervenções poderem ser adicionadas ou removidas durante o ensaio, e destes estudos poderem decorrer perpetuamente até ser desejado pelos investigadores. Os ensaios seamless, por sua vez, vieram preencher a lacuna do elevado tempo de desenvolvimento destes medicamentos, integrando várias fases dos ensaios (normalmente fase I e II) no mesmo protocolo de estudo, utilizando medidas adaptativas, e acelerando o desenvolvimento de medicamentos através do aumento da flexibilidade e de ajustes ao protocolo em tempo real.
Apesar de versáteis e eficientes, acabam por surgir alguns desafios com estes novos ensaios, uma vez que implicam desafios logísticos e regulamentares, análises de dados em tempo real, monitorização contínua, constantes adendas ao protocolo, conhecimentos estatísticos sólidos, e treino muito específico de equipas de investigação. No entanto, é já possível ver frutos bem sucedidos deste trabalho, com tratamentos inovadores como o pembrolizumab e laroctretinib - inibidores das proteínas PD-1 (programmed cell death protein 1) e da TRK (Tropomyosin receptor kinase), respetivamente - que utilizaram novos designs, ultrapassaram desafios regulamentares, receberam designações de terapia órfão e revolucionária, e conseguiram aprovações aceleradas tanto pela Food and Drug Admnistration (FDA) como pela European Medicines Agency (EMA).
Portanto, apesar de exigente e em crescimento, a medicina de precisão mudou para sempre o panorama da oncologia e, embora acarrete desafios, esta abordagem consegue ser mais eficiente, reduzir custos dos cuidados de saúde e taxas de atrito na investigação clínica, e proporcionar aos doentes uma abordagem personalizada para as suas características específicas, com menos efeitos secundários, cumprindo o ideal a que a medicina de precisão se compromete de levar “o medicamento certo, ao doente certo, no tempo certo”. Clinical research is the method upon which we assess, study, and develop new medicines to improve human health across all therapeutic areas. Oncology research has a particularly interesting evolution, as it has undergone a tremendous paradigm shift due to the advent of precision medicine. This brought Oncology researchers the challenging task of innovating clinical trial designs aiming to adapt to these new classes of drugs while improving research and healthcare quality. In this dissertation, an extensive narrative review is conducted to follow Oncology’s research journey, painting a picture beginning when radiotherapy and chemotherapy emerged, going through the most traditional methods, and ending with the dawn of targeted therapies and immunotherapies. Advancements in genetic sequencing have enabled the distinction of cancers by their genetic mutations, and to specifically target cancer cells based on these alterations rather than on their location. With this, several common aspects of trial designs shifted, and we are now presented with adaptive trials, seamless designs, master protocols, tissue-agnostic drugs, and biomarker-driven studies, that defy the traditional “one-size-fits-all” method and give room to adaptable and innovative clinical trials. Overall, precision medicine changed forever oncology’s landscape, and although it entails challenges such as protocol complexity and the need for solid statistical proficiency, this approach can be more efficient, reduce healthcare costs and attrition rates in research, and give patients a unique tailored approach, with fewer side effects, personalized for each patient-specific characteristics. |
Descrição: | Tese de mestrado, Investigação Clínica, Universidade de Lisboa, Faculdade de Medicina, 2024 |
URI: | http://hdl.handle.net/10400.5/97563 |
Designação: | Mestrado em Investigação Clínica |
Aparece nas colecções: | FM - Dissertações de Mestrado |
Ficheiros deste registo:
Ficheiro | Descrição | Tamanho | Formato | |
---|---|---|---|---|
13498_Tese.pdf | 1,79 MB | Adobe PDF | Ver/Abrir |
Todos os registos no repositório estão protegidos por leis de copyright, com todos os direitos reservados.