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Abstract(s)
Introdução: Analisar a perspetiva dos doentes durante um ensaio clínico é uma oportunidade
para recolher informação única sobre as suas experiências com a doença e o seu tratamento
e, sobretudo, sobre o seu impacto na qualidade de vida, contribuindo para o desenvolvimento
de terapias e cuidados de saúde mais adequados. Os denominados Patient-Reported
Outcomes (PRO) proporcionam uma perspetiva holística dos objetivos do tratamento, e têm
sido cada vez mais reconhecidos como um complemento essencial dos outcomes clínicos
[tais como a Sobrevivência Global, Sobrevivência Sem Progressão e segurança] e
laboratoriais (como por exemplo os biomarcadores). A inclusão de PRO é reforçada nas
diretrizes para o desenvolvimento de medicamentos oncológicos das agências
regulamentares Agência Europeia de Medicamentos (EMA) e Food and Drug Administration
(FDA). A EMA define PRO como "qualquer resultado avaliado diretamente pelo próprio doente
e é baseado na perceção do doente de uma doença e do(s) seu(s) tratamento(s)", abrangendo
assim medidas de dimensão única e multidimensionais, tais como sintomas, sentimentos,
funcionamento, bem-estar e satisfação com o tratamento. Assim, a inclusão de PRO como
outcome de um ensaio clínico é de valor acrescentado tanto para as partes interessadas,
como para os pagadores, uma vez que contribuem para distinguir entre produtos com efeitos
de sobrevivência semelhantes, motivo pelo qual é encorajado pelos organismos de avaliação
de tecnologias de saúde e organizações profissionais. Os PROM são os instrumentos
desenvolvidos para recolher PRO válidos e fiáveis, e podem ser classificados em duas
categorias:
- Genéricos: desenvolvidos para medir conceitos de saúde, incluindo dimensões únicas
e múltiplas, tais como função física, estado de desempenho, sintomas e dor. Estes
instrumentos são válidos para uma variedade de populações, permitindo comparações
entre doentes sob diferentes ambientes e condições.
- Específicos da doença: concebidos para medir resultados de saúde em grupos
específicos de doentes, dependendo da sua doença. Tendem a ser de maior
relevância clínica e apresentam maior sensibilidade à mudança nos resultados.
Fornecem informação mais detalhada sobre os sintomas e a sua gravidade, bem como
sobre as restrições funcionais experienciadas pelos doentes durante o tratamento.
Contudo, podem não ser capazes de recolher dados sobre toxicidade inesperada
relacionada com o tratamento, permitir comparações entre grupos de doentes e, ao
contrário do PROM genérico, não são tão facilmente incorporados em avaliações
económicas.
Reconhece-se que as doenças oncológicas, e seus regimes terapêuticos, estão associadas
a sintomas significativos e a limitações funcionais. Neste sentido, a perspetiva dos doentes,
especialmente no que diz respeito aos riscos e benefícios de um tratamento, é de valor
acrescentado. Devido ao contexto oncológico, onde a qualidade de vida pode ser mais
relevante do que a longevidade, os PRO começaram a ser cada vez mais utilizados no âmbito
de ensaios clínicos. Apesar de não existir consenso sobre a seleção do PROM adequado,
este deve avaliar um conceito específico, tal como um sintoma, função, ou Qualidade de Vida
Relacionada com a Saúde (QvRS).
No âmbito de um ensaio clínico, o PRO pode apresentar evidência para suportar a aprovação
de medicamentos e posteriormente permitir inclusão de PRO claims no Resumo das
Características do Medicamento (RCM). Apesar do reconhecimento prematuro da importância
5 da utilização dos PRO em oncologia, a sua incorporação consistente no processo de
aprovação regulamentar enfrenta vários desafios, nomeadamente a falta de normas para a
seleção e metodologia do PROM, a má condução dos estudos, resultando na falta de dados
e suscetibilidade a viés, a existência de efeitos secundários interpretados como sintomas,
existência de instrumentos que não captam as preocupações de doentes assintomáticos e o
uso crescente de desenhos de ensaio com desenho open-label ou de braço único. Para além
destes fatores, as autoridades regulamentares diferem nos critérios para a aprovação de PRO
claims a serem incluídas no RCM. No entanto, a sua integração no processo de tomada de
decisão regulamentar é de interesse crescente e as agências têm colaborado
internacionalmente para harmonizar a incorporação da PRO na prática regulamentar.
Em 2019, uma revisão dos RCM dos medicamentos oncológicos aprovados pela FDA e EMA
entre 2012 e 2016, demonstrou que um terço das indicações oncológicas aprovadas incluíam
PRO claims. Além disso, foi constatado que ambas as agências identificaram os dados de
PRO em falta (missing data) como problemáticos para a interpretação dos resultados. Assim,
é de extrema relevância caracterizar a utilização de PRO nos últimos anos e compreender o
progresso da sua utilização no apoio às decisões regulamentares. O objetivo deste estudo é
analisar a evidência baseada nos PRO existentes nas novas indicações oncológicas
aprovadas pela EMA entre 2017 e 2020.
Metodologia: Através de uma pesquisa sobre as minutas do Comité dos Medicamentos de
Uso Humano (CHMP), identificaram-se os novos medicamentos e indicações oncológicas
aprovados pela EMA entre 2017 e 2020. Para cada medicamento, os respetivos Relatório
Público Europeu De Avaliação (EPAR) e RCM foram extraídos do website da EMA. Para
efeitos de análise, os medicamentos foram classificados por tipo de cancro. A recolha de
dados do EPAR incluiu o nome da marca e a Denominação Comum Internacional (DCI);
indicação terapêutica; titular da autorização de introdução no mercado; estudo(s)
confirmatório(s); desenho do estudo; comparador(es); número de doentes; presença de PRO
e PROM; estado do outcome PRO; nome do PROM e, comentários do revisor do EPAR. Os
PROM utilizados foram categorizados como genéricos e específicos e a sua seleção foi
avaliada. A secção ‘5.1 Propriedades farmacodinâmicas’ do RCM foi revista para identificar
PRO claims. Para fins de análise efetuada, as claims identificadas foram classificadas como
QvRS, estado de saúde global, sintomas e/ou funcionamento.
Resultados: Foram aprovadas 128 indicações oncológicas pela EMA, 100 (78,1%) incluíram
PRO nos ensaios clínicos confirmatórios. Destas, 37 indicações (37,0%) derivam de ensaios
clínicos aleatorizados e as remanescentes 63 de ensaios clínicos open-label. Os PRO foram
definidos como endpoint secundário em 60 estudos (57,7%), exploratórios em 31 (29,8%) e
como ambos em 13 (12,5%). No total, foram utilizados 56 instrumentos distintos, dentro dos
quais 41 (73,2%) eram PROM específicos. A seleção de PROM incidiu essencialmente nas
medidas EORTC (41,3%), FACIT (17,1%) e EQ-5D (29,2%). 76 indicações (59,4%)
apresentam comentários dos revisores no EPAR, contudo apenas 22 indicações (17,8%)
incluíram PRO claims no RCM, a maioria correspondente a tumores sólidos.
Conclusão: Apesar do crescente reconhecimento do valor dos dados PRO no
desenvolvimento de novas terapias oncológicas, a sua implementação em ensaios clínicos
oncológicos continua a ser um desafio. As principais razões identificadas no presente estudo
estão relacionadas com o desenho do estudo, a falta de dados, a condução dos ensaios
clínicos e a seleção do PROM.
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Embora a EMA considere o desenho duplamente cego o mais indicado para a recolha de
dados PRO, o presente estudo demonstra que a EMA reconhece resultados de desenhos
open-label, desde que acompanhados por um planeamento apropriado. Adicionalmente, a
ausência de dados (missing data) permanece um obstáculo e está frequentemente associada
à fraca adesão por parte dos promotores e equipas do estudo. Consequentemente, o
envolvimento de todos os intervenientes, incluindo os doentes, deve ser fomentado. Os PROM
mais utilizados continuam a ser European Organisation for Research and Treatment of Cancer
Quality of Life Questionnaire (EORTC QLQ) e Functional Assessment of Chronic Illness
Therapy (FACIT), independentemente do tipo ou estadio do cancro. Dado que estas medidas
se focam na QvRS, podem não apresentar sensibilidade para todas as terapias oncológicas.
Apesar de uma extensiva literatura de PROM estar disponível, é possível que os PROM
utilizados no âmbito de ensaios clínicos de medicamentos oncológicos necessitem de uma
evolução para satisfazer os requisitos das novas terapias. No processo de seleção dos PROM,
o diálogo e contacto prévio com as agências regulamentares é recomendável, de forma a
assegurar a sua adequação à população e objetivo do estudo. Apenas 17,2% das indicações
oncológicas incluídas nesta revisão incluem PRO claims no RCM, sendo que metade se
baseiam em resultados sem significado clínico entre braços. Desta forma, sugere-se que a
EMA considera que a QvRS vai para além das avaliações de eficácia e segurança e pode ser
suportada por endpoints secundários e exploratórios. Finalmente, sublinha-se que 86% das
claims concedidas mencionam a QvRS e o estado geral de saúde, confirmando que a EMA
utiliza mais frequentemente claims de qualidade de vida.
Embora a implementação de PRO permaneça um desafio no contexto dos ensaios clínicos, o
seu recurso proporciona mais-valias: monitoriza os sintomas dos doentes, facilita tomadas de
decisão partilhadas e apoia decisões económicas, contribuindo para um sistema de saúde
otimizado e centrado no doente.
Background: Cancer diseases, and their respective treatment regimens, are associated with significant symptoms and functional limitations. Within this context, where quality of life may be more relevant than longevity, collection of patients reported outcomes (PRO) in clinical trials is of special interest and recommended by regulatory authorities. Within clinical trials framework, PRO may provide evidence to support drug approval, labelling and marketing claims. The present study aims to analyse the evidence based on PRO of new oncology indications approvals by European Medicines Agency (EMA) between 2017 and 2020 and to identify PRO label claims granted. Methods: Oncology drugs and indications approved by EMA between 2017 and 2020 were identified. European Public Assessment Report (EPAR) and Summary of Product Characteristics (SmPC) were reviewed for each drug to identify PRO use and PRO label claims.r Results: A total of 128 oncology indications, corresponding to 76 medicines, were approved; of those 100 (78.1%) included PRO in the confirmatory clinical trials. 37 indications (37.0%) were supported by randomised trials and the remainder 63 by open-label trials. PRO were defined as a secondary endpoint in 60 studies (57.7%), exploratory in 31 (29.8%) and as both in 13 (12.5%). In total, 54 different measures were used, of those 41 (75.9%) were diseasespecific measures. Nevertheless, PROM selected relied on the EORTC (41.3%), FACIT (17.1%) and EQ-5D (29.2%) measures. A total of 76 indications (59.4%) had PRO reviewer comments included in the EPAR, however only 22 indications (17.8%) included label claims in the SmPC. The reasons identified in the EMA reviewers’ commentaries to exclude PRO claims were described for 34 indications (44.7%). Conclusions: Despite growing recognition of the value of PRO data for the development of improved cancer therapies, PRO implementation remains challenging. The main reasons identified in our study are related with study design, missing data, study conduct and PROM selection.
Background: Cancer diseases, and their respective treatment regimens, are associated with significant symptoms and functional limitations. Within this context, where quality of life may be more relevant than longevity, collection of patients reported outcomes (PRO) in clinical trials is of special interest and recommended by regulatory authorities. Within clinical trials framework, PRO may provide evidence to support drug approval, labelling and marketing claims. The present study aims to analyse the evidence based on PRO of new oncology indications approvals by European Medicines Agency (EMA) between 2017 and 2020 and to identify PRO label claims granted. Methods: Oncology drugs and indications approved by EMA between 2017 and 2020 were identified. European Public Assessment Report (EPAR) and Summary of Product Characteristics (SmPC) were reviewed for each drug to identify PRO use and PRO label claims.r Results: A total of 128 oncology indications, corresponding to 76 medicines, were approved; of those 100 (78.1%) included PRO in the confirmatory clinical trials. 37 indications (37.0%) were supported by randomised trials and the remainder 63 by open-label trials. PRO were defined as a secondary endpoint in 60 studies (57.7%), exploratory in 31 (29.8%) and as both in 13 (12.5%). In total, 54 different measures were used, of those 41 (75.9%) were diseasespecific measures. Nevertheless, PROM selected relied on the EORTC (41.3%), FACIT (17.1%) and EQ-5D (29.2%) measures. A total of 76 indications (59.4%) had PRO reviewer comments included in the EPAR, however only 22 indications (17.8%) included label claims in the SmPC. The reasons identified in the EMA reviewers’ commentaries to exclude PRO claims were described for 34 indications (44.7%). Conclusions: Despite growing recognition of the value of PRO data for the development of improved cancer therapies, PRO implementation remains challenging. The main reasons identified in our study are related with study design, missing data, study conduct and PROM selection.
Description
Tese de mestrado, Regulação e Avaliação do Medicamento e Produtos de Saúde, 2022, Universidade de Lisboa, Faculdade de Farmácia.
Keywords
Oncology Patient-reported outcome (PRO) European Medicines Agency (EMA) Summary of product characteristics (SmPC) claims Teses de mestrado - 2022