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A Sintaxe das Construções Refutativo-corretivas em Português Europeu
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Construções de "mas" em estruturas corretivas e de negação de expectativas
Publication . Canceiro, Nádia Alexandra Santos; Matos, Gabriela; Colaço, Madalena; Lourenço-Gomes, Maria do Carmo
Diferentemente do espanhol e do alemão, que possuem duas conjunções coordenativas adversativas distintas (pero e sino; e aber e sondern, respetivamente), o português europeu (PE) possui apenas o morfema mas, veiculando quer o valor de negação de expectativas quer o de correção.
Nestas línguas que têm apenas um mas, como o PE e o francês (veja-se Anscombre & Ducrot, 1977), assume-se classicamente que o valor de correção está principalmente associado a construções do tipo não X mas Y (cf. Horn, 2001). Por outro lado, frases com a estrutura X mas não Y, têm sido frequentemente descuradas quanto à definição do seu valor. No entanto, Vicente (2010) e Steindl (2017) assumem que em espanhol e alemão é possível nesta construção ocorrerem as conjunções adversativas pero e aber, típicas de contextos de negação de expectativas, com partículas de polaridade no segundo termo coordenado, veiculando o valor de correção.
Apresentámos evidência empírica de que as frases adversativas devem ser analisadas da seguinte forma: (i) as frases com negação frásica (no primeiro termo) devem ser analisadas como coordenação de dois constituintes subfrásicos, sendo que apenas o primeiro está sob o escopo da negação, por questões de localidade e também pelo facto de mas bloquear a negação para o segundo termo; (ii) quanto aos casos com negação de constituintes, a análise adotada será de coordenação de sintagmas (sem elipse) mesmo quando são CPs; (iii) por fim, para frases com negação frásica no segundo termo coordenado, seguindo Saab (2008) para espanhol e Matos (2017) para o PE, assumimos que estas construções são casos de Elipse de TP com itens de polaridade, como também foi assumido por Vicente (2010 ) para frases com pero + itens de polaridade, que, na sua investigação, correspondem a coordenação frásica + elipse.
Quanto aos valores da conjunção adversativa, nesta investigação, de forma a complementar a análise teórica, construímos duas tarefas de Compatibilidade Contexto-Frase, em que os participantes eram expostos a uma frase-alvo e dois contextos: um com valor de correção e outro de negação de expectativas. Na tarefa, foi-lhes solicitado que avaliassem qual o contexto mais compatível com a frase-alvo ou, alternativamente, se ambos eram.
A primeira tarefa incluiu frases com negação frásica e de constituintes, no primeiro termo coordenado. Os dados obtidos sugerem uma preferência pela leitura cumulativa de correção e negação de expectativas, e não apenas de correção. Os dados também revelaram que, diferentemente do que é referido na literatura, a negação de constituintes não facilita a interpretação corretiva.
Na segunda tarefa, as frases-alvo foram manipuladas e a negação (frásica ou de constituintes) surgia no segundo termo coordenado, correspondendo, assim, a frases com Elipse de TP e Contraste Sintagmático. Os resultados indiciam uma preferência pela leitura de negação de expectativas, em ambas as construções. Porém, a leitura corretiva não foi rejeitada, provando, assim, que é possível ter um elemento negativo no segundo termo coordenado e obter uma interpretação de correção.
Estes dados analisados nesta investigação mostram que a ligação assumida por alguns autores entre os valores da conjunção e a configuração sintática não é robusta. Vicente (2010), por exemplo, afirma que frases corretivas correspondem a coordenação frásica + elipse (cf. Clause-Only Coordination Hypothesis), diferentemente de construções com valor de negação de expectativas que podem ser analisadas como coordenação subfrásica ou frásica. Quanto às frases corretivas, Toosarvandani (2013) e Steindl (2017) consideram que é possível aceitar uma análise de coordenação frásica + elipse, embora os argumentos não sejam suficientemente robustos para excluir a hipótese de coordenação subfrásica.
Os nossos resultados mostram que não há uma ligação direta entre estrutura sintática e valor semântico (num sentido amplo e estrito). Os participantes do nosso estudo revelaram uma preferência por uma leitura cumulativa ou de negação de expectativas, e estas leituras não se correlacionam com a sintaxe.
Nesta tese também exploramos construções incoordenadas, que se caracterizam pela presença de mas e de uma frase, que ocorre na posição do segundo termo, e que possui o valor de negação de expectativas (cf. Kuteva et al, 2017). Retomamos o trabalho de Kuteva et al e propomos uma análise para frases incoordenadas e para o estatuto do conector coordenativo que nelas ocorre.
Propomos a existência de dois tipos de frases incoordenadas, dependendo de como é legitimada a sua ocorrência. Distinguimos entre verdadeiras incoordenadas e pseudo-incoordenadas: as primeiras são legitimadas pela sua conexão com um contexto não-linguístico; as últimas têm um primeiro termo omitido, que pode ser recuperado pelo conteúdo linguístico do fragmento discursivo anterior.
Quanto ao estatuto de mas nestas construções, levantamos a hipótese de que mantém a sua natureza conjuncional, e que possui o traço [± coordenativo]. Este traço será valorado como [+ coordenativo] em frases coordenadas ou pseudo-incoordenadas, por ter, nestas construções, uma função coordenativa; e o valor [- coordenativo] será associado às verdadeiras incoordenadas, revelando sua natureza não coordenativa. Também propomos que mas incoordenado não verifica todas as propriedades associadas às conjunções, por, na verdade, algumas serem propriedades da coordenação.
No geral, este trabalho lança luz sobre a interação entre sintaxe, discurso e valores semânticos/pragmáticos associados a construções adversativas. Além disso, acreditamos que nossa investigação sobre a incoordenação mostra que este processo estende a sintaxe às estruturas discursivas.
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Fundação para a Ciência e a Tecnologia
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SFRH/BD/138048/2018
